Tribunal. Juizos Criminais do Porto.
Onze da manhã e aguardo, sonolentamente, pela minha vez.
O julgamento, agendado para as 9,15 h está, como sempre, atrasado.
Na audiência que decorre, e que antecede aquela onde o meu cliente é protagonista, discute-se a emissão de uns cheques sem provisão .
No final, e pretendendo apurar a situação económica da arguida (essencial para aplicação da pena adequada, caso seja de multa), estabelece-se o seguinte diálogo entre esta e a magistrada:
“JUIZ – Então quanto ganha?
ARGUIDA – 70 ouros
JUIZ – 70 euros por um mês de trabalho?
ARGUIDA – Sim
JUIZ – A senhora quer que eu acredite?
ARGUIDA – Ora bem (hesita. Pensa um pouco e atira): a senhora doutora dá-me licença de dizer em dinheiro?
JUIZ – Em escudos, é?
ARGUIDA – Sim, em dinheiro. São quase 140 contos. Eu não compreendo nada dessa coisa dos ouros. Em dinheiro é mais fácil de falar.
JUIZ – A senhora foi à escola até quando?
ARGUIDA – Até à quarta classe.”
Estou convicto que a história é demonstrativa do muito que há a fazer até que este passo da integração europeia (a moeda única) esteja concluído. Não chega o papel. É precisa a aculturação.
E, perante este cenário, pergunto: que sentido faz avançar-se, à força, para uma integração ainda mais alargada, que comporte, entre outros, uma lei constitucional comum (e se calhar, mais tarde, um só exército, uma só soberania, uma só lingua etc.etc.), como aquela que brevemente referendaremos?
Penso que nenhum.
E são exemplos como este que me alimentam a esperança de, se não for pelo convencimento, pelo menos pelo tiro à sorte, que o referendo sobre a constituição europeia venha a chumbar, em França e entre nós.
terça-feira, maio 17, 2005
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